do nada apareceu uma mendiga pedindo dinheiro.
eu já não sabia mais o que fazer. digo, pra mendiga eu dei o dinheiro. mas eu tinha que me declarar pra… vou chamar de Ela.
mas quem era Ela afinal?
Ela foi uma paixão da adolescência. mas, em vez de cair pro platonismo, quando nos conhecemos na primeira série do ensino médio, eu resolvi fazer amizade. eu era um nerdão que gostava de metal e coisas que eu achava ~alternativas~ porque era um caipira que nunca tinha visto nada do mudo. se tivesse visto, eu provavelmente saberia que nada do que eu gostava que eu achava ~alternativo~ o era de fato.
Ela tinha uma vibe meio manic pixie dream girl. esquisita o suficiente pra ser odiada pelas padrão, mas, ainda assim, padrão o suficiente pra todo mundo achar bonita. é claro que eu tô te oferecendo a visão que eu tenho hoje da visão que eu tinha quando eu tinha 15 com vocabulário que vai pra além das 252 palavras que eu sabia falar naquela época.
era, porém, e disso eu tinha bastante consciência, um voo alto demais pra mim. ela namorava um cara mais velho, que tinha carro e tudo — dois até; um vermelho que Ela falava que era carro de puta, e um mais velhinho que ela chamava de Kill Bill —, o Fela (vou chamar o cara de Fela) era, na verdade, um cara muito legal, gente finíssima. saí com eles uma vez ou outra.
foi um rolê meio a meio — meio deprimente, meio lamentável.
então, nesse ano que a gente se conheceu, só deu pra fechar numa amizade de fazer os trabalhos da escola juntos, o que era um avanço nos meus avanços com o gênero oposto, mas, ainda assim, é meio que aquela "amizade" por tabela porque envolve um contexto que vai ter sempre mais um monte de gente e também rola uma conveniência acadêmica — eu era um moleque muito pouco esforçado, mas definitivamente, não era um dos burrinhos da escola.
no ano seguinte, porém, ela terminou. o cara foi pra outra cidade e acho que eles nem cogitaram manter um lance à distância. Ela e eu continuamos estudando junto. várias pessoas que andavam com Ela na turma do ano anterior foram embora também e acabou que ficamos mais próximos. por um tempo, bastante tempo na verdade, eu tinha dado uma desencanada legal de Ela e tava deixando quieto. porém, teve um dia que num dos rolês aleatórios e despretensiosos da galera, a gente acabou sozinho no ponto de ônibus. ela tava só esperando eu pegar o ônibus, porque o ponto era na rua dela. daí, um espasmo de coragem me possuiu.
vou falar pr!
quando engrenei no que eu ia dizer, apareceu uma mendiga do nada. eu peguei a primeira nota que eu tinha e dei sem olhar. era uma nota de 20. Ela ficou meio surpresa. isso na época devia ser tipo uns 50 reais hoje. mas eu, egoísta, e pouco socialmente preocupado. só queria me declarar.
assim, o fiz. e… obviamente não deu em nada.
Ela me olhou com cara de paisagem, falou alguma coisa que com certeza não quis dizer nada, que eu não lembro.
o ônibus passou e eu fui embora.
Ela trabalha do lado do meu emprego e às vezes eu me pergunto se ela lembra disso.
provavelmente, não.
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bjs e abçs
Xurrasquinho